
Talvez vocês tenham visto Duna partes 1 e 2 no cinema recentemente. Se não viram, recomendo, especialmente o segundo, que coisa espetacular essa versão da história (e eu não esperava que o Thimothée Chalamet fosse incorporar de um jeito tão eficiente o Paul Atreides, especialmente depois que ele abraça a narrativa mitológica/messiânica).
Os filmes são adaptações do livro homônimo de Frank Herbert, lançado em 1960, e que tem a seguinte premissa: em uma era pós-tecnológica, a humanidade dominou o espaço e grandes impérios intergalácticos, com tudo o que isso implica (relações político-econômicas, religiosas, culturais), surgiram. No meio disso tudo, está a busca da especiaria, substância capaz de afiar os sentidos humanos e permitir que essa sociedade funcione. Em um arranjo imperial, a família Atreides fica responsável pela extração de especiaria de Arrakis, o planeta Duna, um mundo desértico e de vida duríssima. A história acompanha o jovem Paul Atreides, herdeiro da família de mesmo nome, que acompanha seus pais (sua mãe, Jessica, é a protagonista da primeira parte da história mais do que ele mesmo) no novo e duro planeta. Lá, terão de fazer laços com o povo nativo (os fremen, o povo do deserto e que se adaptou para as condições do lugar) e também com a família rival, os Harkonnen, particularmente cruéis, e que querem aumentar seu próprio poder. Porém, depois de várias reviravoltas que ocupam a primeira metade do livro, Paul Atreides vai ter de sobreviver - e isso inclui abraçar não apenas suas habilidades físicas, mas também a geografia local, a mitologia e todo um mundo que se revela no meio de toda a areia.
Esse é um dos livros que inaugura um estilo de ficção científica chamado space opera (ainda que tenham obras mais antigas, especialmente saídas do pulp, e quadrinhos como Flash Gordon) e que foi desembocar em inspiração direta para obras como Star Wars (e eu AMEI que o Villeneuve consegue evitar usar as referências visuais de Star Wars, que seriam as óbvias, mas são posteriores no filme) ou mesmo Game of Thrones (a consistência política da trama dialoga muito com Duna).
Esse é um dos meus livros prediletos de muito, mas muito longe. Está no meu top 10 livros da vida muito facilmente. É um livro que até demora a engrenar, mas depois que engrena, é uma trama maravilhosa sobre manipulação de massas, política, messianismo e aquela ciência que de tão avançada acaba virando magia. Tem uma passagem do livro, quando o Paul resolve que precisa abraçar o papel mítico que foi destinado/construído para ele, e ele comanda o povo fremen pela primeira vez que, mesmo tendo sido lido quase vinte anos atrás, me arrepia só de pensar. As últimas linhas do livro (o final do filme do Villeneuve é o oposto do que acontece no livro e eu GOSTEI da mudança) também me arrepiam até hoje.
E eu soube que o livro me fisgaria bem no comecinho, quando é apresentada a litania contra o medo, nos seguintes termos:
“Eu não devo ter medo.
Medo é o assassino da mente.
Medo é a pequena morte que leva à aniquilação total.
Eu enfrentarei meu medo.
Permitirei que passe por cima e me atravesse.
E, quando tiver passado, voltarei o olho interior para ver seu rastro.
Onde o medo não estiver mais, nada haverá.
Somente eu permanecerei”
Ao longo da vida, eu já recitei muito esses versos. E enfrentar o medo é uma das coisas mais difíceis da vida.
A frase que usei para nomear esse capítulo, o medo é o assassino da mente, é uma grande verdade. O medo nos faz perder. O medo nos tira e o medo nos mata aos poucos até nos destruir por completo.
Óbvio que temos aqueles medos racionais com os quais precisamos lidar para sobreviver, mas tem todos aqueles outros que fogem da racionalidade e estão lá para nos matar aos poucos. O medo de uma crítica negativa. O medo de não estar a altura, de não ser boa o suficiente. O medo da frustração. O medo de tomar a palavra e a frente. O medo de se expor. O medo do passo além.
Agora eu vou ter de recorrer à frase de outro livro favorito, quem quiser nascer precisa destruir um mundo. Quem quiser viver, precisa vencer o medo. O que não é fácil.
Mas poucas coisas na vida são mais poderosas do que ver que ficamos após passado o rastro do medo.
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Até a próxima!
Que texto inspirador! Por aqui chegou na hora certa, obrigada!
Eu tenho o livro 1 e ainda não li, agora com esse teu texto senti uma certa urgência nessa leitura.
"Poucas coisas na vida são mais poderosas do que ver que ficamos após passado o rastro do medo", essa tua última frase me pegou... Adorei teu texto, parabéns 👏🏻👏🏻